sábado, 25 de junho de 2011

Odisseia, 7, 79 – 135: ékphrasis

Odisseu em lágrimas ao ouvir Demódoco




Resumo da minha fala no II Colóquio "Visões da Antiguidade"




Paulo Martins

Sistematicamente, tomamos contato com considerações a respeito dos procedimentos ecfrásticos como recurso retórico. Essas os circunscrevem. De um lado, a teorização do mecanismo descritivo às doutrinas retóricas num recorte temporal posterior ao século I, fato que, per se, limita a aplicação desse mecanismo a textos posteriores à regulamentação preceptiva, sob pena de incurso num anacronismo conceitual que, muita vez, imprime projeções equivocadas ao objeto observado e analisado. De outro, Essas mesmas considerações restringem os lugares desse tropo às descrições de obras plásticas (technai plastikai) ou pictóricas ainda que elas possam ser fictícias, i. e., phantasías com peso do verbo.

Nesse sentido, teríamos, no primeiro caso, os exercícios preparatórios (progymnásmata) que tratam explicitamente desse procedimento elocutivo e, essencialmente, argumentativo: Hélio Teão, Hermógenes e Aftônio são exemplares em que se pese aqui a distância de mais de 250 anos entre o primeiro e o último. E, no segundo caso, em decorrência dessa teorização realizada a partir século I, tem-se a apropriação do procedimento e consequentemente sua transformação em gênero das letras pela segunda sofística e daí sua utilização autônoma e fora da normatização poético-retórica específica nos textos de Calístrato e de Filóstrato, o Velho e o Jovem.

Fato é que o confinamento nesses dois vieses estreita a compreensão do procedimento descritivo vívido e claro (ékphrasis), pois que o primeiro grupo de autores – gramáticos e retores – aponta para a épica homérica em chave de exemplum a fim de ensinar o que vem a ser o mecanismo, portanto ser infundada a tese de julgamento anacrônico do procedimento às letras anteriores ao século I. Já o segundo grupo, que podemos, classificar de “descritores de obras”, apesar de apontarem para uma suposta restrição do uso, pois delimitam as ekphráseis às “obras de arte”, recuperam nesse inovador gênero a prescrição de inúmeros outros, entre os quais, o épico, o idílico, o epistolar, o trágico etc. Vale dizer também que tanto a prescritiva retórica a partir do I século, como os autores que autonomizam o gênero ecfrástico, são mediados pelas letras helenísticas.

Nosso trabalho hoje visa a fazer uma avaliação retrospectiva do manancial desse gênero, a partir da leitura de uma passagem da Odisseia (7, 79-135) em que os principais elementos de uma ékphrasis tópica – pensando nas 5 possibilidades de Teão – são dadas ao ouvinte/leitor. O desenho arquitetônico de Homero, pois, para o palácio de Alcinoo oferece inúmeros lugares ecfrásticos, que ora será emulado pela construção serial épica antiga, ora será re-operado nos quadros verbais de Filóstrato, o Velho.

Um comentário:

Anônimo disse...

Usei sua foto aqui: http://poesiaemouviescrito.blogspot.com/
Espero que Demódoco, e você, apreciem o uso (apesar da interpretação "dionisíaca" de Ulisses, em geral visto como mais solar)

obrigado